Especulações livres

28 de ago. de 2005

Festival Internacional de Curtas - SP: sobre manifestos




Estava eu aqui querendo começar a escrever sobre a sessão Dark Side do Festival Internacional de Curtas, que está rolando em São Paulo, quando começo a pesquisar imagens para colocar no post. Procurando acabei me perdendo, e me perdendo na rede acabei encontrando o site Cinema de Trincheira [http://cinemadetrincheira.com.br], que contém informações sobre o curta 6 tiros, 60 ml, de André Kapel, exibido na sessão. Encontrei lá também um manifesto que desconhecia, cuja proposta reproduzo abaixo:

O projeto de cinema independente denominado "Cinema de Trincheira" se suporta em um manifesto que atua como proposta de trabalho, procurando resumir a produção cinematográfica ao seu essencial, isolando o set de filmagem e mantendo só o necessário a produção, bem como buscando trabalhar com técnicas que fogem do tradicional. Trabalhar com temas que saiam da mesmice que o cinema nacional se tornou, produzindo um material dedicado a quem vai assisti-lo e evitando egocentrismos desnecessários, ainda que se mantenha uma característica identificável em cada um.

Não conheço muito sobre os detalhes da coisa toda, mas me parece uma proposta influenciada pelo Dogma (tema da segunda metade do post). Eu desconfio, mas ao mesmo tempo sou bastante seduzido por manifestos. Pelas mesmas razões pelas quais sou seduzido pelo que chamo de cinema político, que acho sedutor e perigoso. Pois um manifesto é um chamado à ação, é um estabelecer de regras e propostas, é um ato de vontade sobre as coisas. Isso é sedutor, a meu ver. O perigo que ronda são as simplificações e reduções necessárias para que isso ocorra. Como não sou especialista em cinema, não vou avaliar a pertinência ou não do manifesto, mas sou totalmente a favor da ação, e da busca de alternativas.
Coisa que o filme de André Kapel consegue, na minha opinião, mas talvez não pelas razões que ele expressa conscientemente. Algumas coisas do filme eu não gostei, como alguns tiques à la Tarantino (ou foi só impressão minha?); me parece que ele se dá melhor quando se solta mais. Apreciei demais a seqüência no elevador, e a atriz consegue levar a coisa maravilhosamente, eu achei. Meu amigo tunisiano (que dirigiu o filme Pics, também no festival) puxou papo bem no final do filme e eu acabei não entendendo direito como foi a “explicação”, mas vou cobrar do diretor pessoalmente se puder. Parece que há um longa-metragem feito com base nesse manifesto, Pólvora Negra, mas não diz no site se ele vai ser exibido ou se já foi, fiquei curioso. Dessa sessão, fiquei estarrecido com a simplicidade aterradora do filme Os Dez Degraus, de Brendan Muldowney. Lembrou-me os melhores contos de terror do século XIX, minha primeira escola nesse tipo de história. Adorei também o Organik, ainda que ele seja tão parecido com o Possessão (ver análise de Marcelo Carrard no Mondo Paura). Coagula foi como começar a comer um doce muito gostoso, que de repente me foi tirado da mesa: achei curto demais, queria MUITO mais, enfim... A Porta, de Rita Curvo, achei maravilhoso, na sua estética e na forma como conduz a história, também deveria ter sido muito mais longo.


10 anos de Dogma



Ontem fui, a convite de amigos, assistir à sessão hypada com 3 curtas do movimento Dogma 95. Ansiedade, de Christoffer Boe. Delicioso de assistir, fotografia perfeita, atuações maravilhosas. Me pareceu uma exploração de um relacionamento um tanto neurótico. A forma como a cena de uma peça dá coerência a todo o conjunto me pareceu genial. Fiquei literalmente estupefato com a beleza desse curta, melhor do que a maioria das coisas que ando vendo ultimamente no cinema.
Isso sem falar na emoção de assistir O Menino Que Andava Para Trás, de Thomas Vinterberg. O menino que atua no papel principal é realmente um achado, uma beleza física impressionante. Engraçado como há um clima de nihilismo no ar: meninos de 9 anos desmaiados de bêbados, famílias despedaçadas. A cena na escola me parece antológica: há uma tal falta de laços de intimidade e de sentimento entre as pessoas que leva a uma desconexão total com o mundo. A musiquinha de boas-vindas cantada pelos alunos acentua ainda mais essa dissonância entre o que as coisas deveriam ser e o vazio que elas realmente possuem. Essa desconexão talvez leve o menino a ficar perturbado, ainda mais do que somente a tragédia que acomete a família. Talvez seja essa a premissa do seu outro filme, Festa de Família, mas não saberia dizer em detalhes sem rever o filme. O terceiro curta dessa sessão, Final de semana perdido, não me agradou muito; acho que depois de me identificar demais com os dois primeiros, estava sem fôlego para o terceiro. Bom, fechando em tom mais pessoal, a melhor parte de tudo isso foi poder participar de algo interessante e conhecer pessoas geniais e emocionantes, especialmente na sessão Dark Side. O terror é militância, dizia o cara ensangüentado que apresentou a sessão; o mais legal é compartilhar essas experiências numa cidade cada vez mais alheia a isso tudo.

4 comentários:

Anônimo disse...

E além de tudo, o pessoal do CINEMA DE TRINCHEIRA faz tudo na raça. O que me fascina nesse festival de curtas é que há muito mais liberdade para criações, experimentações e liberdade no cinema, novas alternativas para fugir do convencionalismo atual. E foi por isso que, por volta de 84, aqueles insanos nova-iorquinos criaram o movimento THE CINEMA OF TRANSGRESSION, que, nossa, nem acredito que vou ver essa semana na Sessão Comodoro Especial, não perca. Abraço e, ah, o novo espaço está ótimo, vou atualizar seu link no meu simplório blogue.

André disse...

e aí cara?
pau no cu da uol, blogspot reina.

legal te conhecer lá na mostra darkside, vamos manter o contato.
abraço

Anônimo disse...

Marko, bacana o novo visual cara. Do jeito que a coisa está, muita gente vai sair do BostaUol. Um abraço!

Anônimo disse...

Obrigado por intiresnuyu iformatsiyu

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