Especulações livres

31 de dez. de 2007

Fechando 2007...?


Nao era pra ser um desses posts de fechamento de ano, mas enfim, que seja isso entao. Hoje, depois de meses a fio sem aparecer por aqui, sem clicar nos links, sem comentar no blog de ninguem, dei uma geral no blog. Postei, visitei meus links, apaguei links inativos, adicionei outros, comentei em blog alheio, etc. Lembro-me como se fosse ontem quando comecei a blogar, por inspiracao de uma paixao... Tanta coisa eu comecei assim. Hoje nao me arrependo mais (ja perdi muito tempo me arrependendo de ter tido paixoes. Hoje acho que sou um privilegiado). Para um blog que comecou como uma colecao de reclamacoes, frustracoes e outras inutilidades, la em 2004, acho que o Komentarista virou algo muito mais. Uma valvula de escape para mim, que canalizo toda minha forca criativa para meu trabalho academico (pra que? Nao sei, por enquanto to levando por que nao tenho outra opcao), deixando de fazer aquilo que eu mais gosto na vida (bem, uma das coisas que mais gosto): escrever por prazer. Um e outro conto nasceram aqui, e correram o mundo em outros lugares. Comecei aqui a me soltar em ensaios, que tambem foram publicados em outros lugares, dando-me certa esperanca de que nem tudo esta perdido, um dia ainda poderei realizaer um sonho de infancia e escrever livros, ser "escritor", ainda que eu nao saiba a definicao desse termo. Apego a definicoes: coisa de academico, talvez. Ontem ouvi que sou muito preocupado em definir tudo... Nao nego nem um pouco, so queria entender melhor o que e isso. Seria um defeito? Mas o "point" desse post, desse texto, era mais para falar do blog em si. Sim, outro daqueles posts meta-linguisticos que eu mesmo detesto, por serem tao repetitivos e previsiveis. Pois e, aqui estou, dando-me a liberdade de chafurdar no obvio e no cliche. Um blog e como uma conversa, eu vim a pensar outro dia. Escreve-se, aparecem comentarios, voce responde, voce le os posts de outras pessoas, e isso inspira outros posts, e assim a gente caminha. Na historia desse blog houve duas grandes conversas, que marcaram otimos anos da minha vida, e para quem tem saco e tempo livre, sugiro que explore os arquivos. Um dia, quando eu tiver 70 anos, quem sabe eu tenha saude mental para voltar a alguns posts passados! Como toda conversa, os temas mudam, os participantes mudam. Talvez a metafora melhor seja a de um boteco. Chegam pessoas, outras se vao, as conversas, sempre "profundas", continuam indeterminadamente. Elas nao dependem de um ou outro participante, mas sao fruto das interacoes daqueles que ali estao no momento (opa, calma com o antropologues!). Na verdade, fiquei pensando nas pessoas que entraram e passaram, tal qual vistas atraves desse blog, uma das janelas que acessa a minha "alma". Algumas eu sinto ter perdido, outras eu nem lembro mais. Mas fico feliz que o blog continua. Nao sei para onde caminha a conversa daqui por diante. Talvez nao haja mais criatividade aqui, talvez nao haja mais sentido. Que venham outras coisas, outros temas, outros assuntos, outros participantes. Ainda que eu esteja aqui a falar sozinho, nao ligo, pois a funcao principal aqui sempre foi a de desabafo... Com todo respeito aos que lerem esse texto claro! Peco perdao novamente aos que ofendi ou ignorei, ou deixei de lado, ou nao entendi. Estou tentando sempre melhorar.

30 de dez. de 2007

Imperio dos Sonhos

Foi com muita expectativa reprimida que finalmente assisti a Inland Empire (que acaba de sair em DVD por aqui). Lynch e dos poucos que me faz ver um filme sem pensar muito (como Woody Allen, Mojica, Almodovar, Cronenberg, pelo menos no meu caso). O filme e longo, 2 horas e meia (ou mais), e no final fiquei com a impressao de ter visto uma grande performance de Laura Dern, e de ter visto um filme inacabado. Nao que eu esperasse um filme compreensivel, afinal de contas sou fa do Lynch desde meus 16 anos (quando vi Eraserhead), e sei muito bem que "nao e por ai". Ha uma certa coerencia, eu diria, tematica e estetica, entre esse filme e os outros, mas ouso dizer que fiquei um tanto decepcionado com esse filme, ainda mais se comparado com Mulholland Drive. Vendo Mulholland varias vezes, consegui perceber um extremo cuidado em amarrar todas as pontas supostamente soltas, em brincar com as metaforas e as transicoes aparentemente aleatorias, para tecer um comentario, uma imagem, sobre questoes de ilusao, fantasia, sonhos. Tudo isso que eu havia amado em Mulholland estava citado em Inland Empire, mas de forma realmente aleatoria e pouco amarrada. Como se o filme estivesse por ser editado, como se o argumento nao se completasse no fim, como ocorre em seus outros filmes. A transicao de um mundo para o outro estava la, como em tantos outros filmes, compondo uma certa simetria que e recorrente, mas me parece que nesse filme ela nao cumpre papel nenhum, a nao ser a de estar la, afinal esse e um "filme de Lynch". Quase como uma formula? Nao quero pensar que um dos meus diretores favoritos, que consegue fazer coisas novas e emocionates com a imagem, tenha caido em algum tipo de formula, entao aguardo seus proximos trabalhos com antecipacao e um pouco de preocupacao... Ainda assim, camaradas fas de Lynch, obviamente vale a pena conferir. E um filme longo, mas cheio de imagens arrebatadoras. E quem sabe a maioria discordara do que eu escrevi aqui.

Laura Dern esta brilhante, e carrega um peso desproporcional. Os coelhos sao uma atracao a parte. Li em algum lugar que eles compoe um filme que Lynch fez para a internet, e que nao estao mais disponiveis. Se alguem souber onde acha-los (sao episodios, como num sitcom surrealista), agradeco!

27 de dez. de 2007

Racismo


Ando sumido daqui e sem muito assunto (ou assuntos demais que nao pertencem ao blog). Deixo uma charge so pra nao deixar a poeira acumular demais...

27 de out. de 2007

5 coisas legais (e 5 nem tanto) sobre o Texas...



E muito legal...

1) ...ir numa boite gay country. Alem de surreal, e engracado. Na pista, as pessoas fazem passinhos ensaiados. Dancam em pares como em saloons de filmes de faroeste. Nessas horas eu me lembro que o Texas, ha pouco tempo atras, era o faroeste. As musicas sao emotivas, romanticas, densas como as melhores musicas caipiras brasileiras, ou divertidas como um bom forro.


2) (essa e para quem fala ou estuda ingles) ...poder falar y'all sem ser chamado de caipira.


3) ...ter alunos cowboys. Ele chega para aula, pendura seu chapeu de cowboy na entrada e assiste aula como se nada estivesse acontecendo. Como voces podem notar, eu nao consigo deixar de achar estranho! Uma variacao dessa e ter pesquisadores de grande prestigio trabalharem com suas botas de couro... Unico.


4) ... poder ter contato com a natureza. O texano ainda tem a mitologia das belezas naturais e do contato direto com a terra, o homem em contato com seu meio, coisa que se perdeu na maioria do pais.


5) ... andar de pick-up para qualquer lugar. O texano que se preze (especialmente homem, mas nao necessariamente) anda de caminhao (ou caminhonete), nao de carro. Carros que no Brasil seriam enormes, aqui sao apenas medianos. Os comerciais de caminhao aqui mostram os carros aguentando varias toneladas de carga, etc. O amor do texano por seu carro e um fenomeno tipico dos EUA, mas que toma proporcoes unicas aqui.


Nao e tao legal...


1) o racismo e a xenofobia daqui. O Texas e notoriamente o estado mais reacionario dos EUA. Se voce e mexicano, negro, ou de outra minoria qualquer, sofre bastante preconceito por aqui. Bem velado, pois texanos sao super simpaticos. E chato ser confundido sempre com motorista, pedreiro ou jardineiro so por que tenho olhos castanhos...


2) ... estar tao perto do rancho do Bush, da historia politica do grupo que o levou ao poder, e de todas as coisas que fazem dele o personagem politico que ele e.


3) ... estar no centro da maquina de guerra dos EUA. Mais soldados do Texas morrem no Iraque do que qualquer outro estado. O texano medi e bem nacionalista, e o Bush e como se fosse o presidente do Texas, por isso ha muita lealdade a ele, mesmo num momento onde a maioria da populacao rejeita fortemente a guerra. Ha milicos por toda parte no campus: pois eles treinam ali, e tentam convencer jovens a entrar para o exercito (o servico militar aqui e opcional). A guerra esta por toda parte, a toda hora.

4) ... nao falar espanhol. O Texas era Mexico ha pouco tempo atras, e grande parte da populacao fala espanhol ou tem lacos fortes com o vizinho ao sul. 40% da populacao e "hispanica", e quase todos os empregos de baixissimo rendimento sao feitos por mexicanos imigrantes, illegais na sua maioria (e muitos brazucas ilegais tambem). Sinto que poderia ter tido mais contato com essa parte do Texas se eu falasse espanhol, o que me lembra a mania do Brasil de se achar uma civilizacao a parte na America Latina.


5) ... ter que aguentar a cultura de carros do Texas. Nao ha transporte publico praticamente, e quem nao tem carro como eu vive isolado do mundo. O cumulo para mim foi descobrir os bumper nuts, ou adornos para as pick-ups em forma de testiculo... acho que a imagem fala por si so sobre a paranoia do texano em se expressar atraves do seu carro!

13 de out. de 2007

Transa



Escutando Caetano... coisa dos meus 17 anos, quando ainda achava que fazia sentido ser hippie, quando nao sabia que era so de boutique. Gal Tropical: talvez eu tenha escutado esse disco ainda no utero, ou quando muito novo. Uma vez, em SP, escutei num carnaval, dentro de uma boite (alguem lembra do Massivo?). Algo tremeu em mim, como se la no fundo algo me tocasse e me causasse um extremo prazer. Talvez fosse nos meus dias la em Sao Pedro, antes das brigas e das discussoes, das depressoes e incompreensoes, quando o sol e o ceu azul e eu seguia as borboletas pelo jardim, cheirando rosas e nem prestando atencao para as orquideas, que tanto me impressionam hoje. O balance, ficou comigo entao, e talvez eu escute isso agora como nostalgia comprada online, como forma de cutucar meu cerebro a lembrar desses momentos mais puros e divertidos. Ou talvez eu esteja, apesar de tudo, num desses momentos, no auge da minha felicidade, ainda que numa encruzilhada. Encruzilhadas sao sempre lugares amedrontadores, liminares, cheios de promessas e perigos. Sinto um frio na barriga!

4 de out. de 2007

carinho



Sobre o odio



Engracado receber "hate mail", mensagens de odio. Coisas assim nao tem muita razao de ser: alguem leu algo seu que detestou, e tal pessoa quis que voce soubesse disso. Eu ja fiz isso antes, e ja recebi muitas outras mensagens desse tipo. Nunca e legal, as vezes doi mais do que outras. Posso racionalizar? E inevitavel: se voce publica suas coisas, esta pondo a cara a tapa. Outra: faz parte da liberdade de expressao, coisa que apoio sempre.
PS: o pior e que nunca esperava receber hate mail de coisas que publico aqui... As vezes, por mais que tentemos ser inofensivos e neutros, acabamos ofendendo alguem de qualquer forma.

27 de set. de 2007

Pensamentos curtos



Ontem, enquanto batalhava contra a insonia pela enesima vez, pensei comigo: Como sera o dia em que eu nao precisar mais pensar na minha proxima casa, na proxima cidade em que vou morar, no proximo emprego que preciso arrumar? Sera que esse dia chega? E se chegar, sera que consigo me adaptar a isso? Sera que vou sentir falta dessa transitoriedade constante que vivo desde ha muitos anos? Sera que tenho saco para casamento, coisas fixas, rotinas? Sera que e tao bom quanto falam por ai? Deu vontade de experimentar, mas da medo tambem...

4 de set. de 2007

Pirlimpimpim

Dificil descrever o quanto eu amava esse especial da Globo, especialmente a musica cantada por Baby Consuelo (qual o nome dela agora?), sobre a Emilia. Eu sempre fui fa da boneca, e nao me cansava de escutar e dancar essa musica interminavelmente. Agora que escrevo, vejo que voltei a fazer coisas semelhantes depois de "velho"... Pois e, engracado rever essas cenas marcantes da infancia (hoje em dia, gracas a tecnologia, conseguimos fazer isso), reavaliar, ver com outros olhos. De certa forma as memorias nos carregam de volta, para os bons e maus momentos, mas acho que a magica daquele tempo nao vai embora. Sei la, acho que estou meio mole assim por que andei vendo criancas, filhos de amigos. Posso estar e ficando velho mesmo, afinal o aniversario se aproxima. Ou sera que lidar com alunos deixa a gente assim? Enfim, pra quem e dessa geracao nascida nos anos 1970, creio que todos se lembram disso:

3 de set. de 2007

Um naco do Brasil onde a lei brasileira não vale

Retirado do Blog do Josias de Souza, da Folha de S. Paulo (http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/).
Independentemente da posicao do leitor pro ou contra as acoes do Greenpeace, ou da sua posicao pro ou contra fazendeiros, fica em relevo os abusos contra direitos humanos basicos nesse caso. Um retrato nao so da fragilidade institucional no extremo norte do pais, mas do pais como um todo, afinal coisas semelhantes acontecem em areas de qualquer cidade media ou grande do Brasil.

23 de ago. de 2007

I love Disco...

E pronto, adoro essa musica... Nada de mais para postar, so precisando dancar um pouco mesmo, a vida anda monotona.

9 de ago. de 2007

Imagens nao morrem

Clique no link e veja o trailer do ultimo do Mojica:



Tenho que dizer que fiquei impressionado. Tudo bem, nao sou confiavel, sou fa demais, talvez esteja querendo ver um grande filme onde nao existe um. Achei o trailer fantastico. Primeiro, por que finalmente Mojica fez um novo filme. Segundo, por que me parece que realmente esse filme pode chegar perto das obras-primas dos anos 1960. O trailer e filosofico, metalinguistico, brincando com a historia pessoal do Mojica, como em Despertar da Besta. Enfim, e apenas um trailer, mas mal posso esperar pelo filme...

4 de ago. de 2007

Algo de podre em Pindorama

Parece que o Youtube torna-se, cada vez mais, num mecanismo de perturbacao da ordem vigente, numa especie de praca publica barulhenta e caotica, onde as aliancas, mediacoes e censuras da antiga praca publica, a midia televisiva e jornalistica, nao se aplicam. Ou seja, o equilibrio que se ve nas outras midias, que no Brasil baseia-se numa ilusao de liberdade de imprensa que esconde um elitismo e governismo endemicos, nao conseguiu ainda implantar-se na internet de forma duradoura. Por essas e outras, ao redor do mundo, o Youtube causa comocao ao tornar publico e visivel aquilo que deveria, pelo bem do teatro social, permanecer invisivel.





Ironico que, ao mesmo tempo em que nasce a campanha do Cansei (que conheco apenas pela midia eletronica, ja que nao estou no Brasil), vemos essa mesma "elite" jogar um ovo podre pra cima, o qual inevitavelmente acertou-lhe a fuca: em questao, o video "ovos em Copacabana". O interessante desse video e a inocencia e "naivete" dos personagens envolvidos. A composicao do video remete ao que ha de mais canonico nesse tipo de video: uma festa bastante informal, pessoas descontraidas mostrando seu lado mais intimo, uma camera com visao noturna indicando uma intimidade relacionada a um certo "proibido" (pelo menos desde a multiplicacao dos videos de sexo pela internet), uma falta de censura que poderia ser relacionada ao proprio meio. Como disse acima, o Youtube, e a internet em geral, ainda nao adquiriu maturidade e legitimidade social como outros meios de comunicacao, e muito do que vemos no site tem a ver com o olhar furtivo e voyeuristico de cameras minusculas que mostram aquilo que as pessoas fazem "no escuro", "por debaixo do pano", longe das censuras sociais e das convencoes.
Por isso mesmo, ao me deparar com os protagonistas do video, dois jovens loiros e aparentemente abastados, jogando ovos pela janela, tentando acertar carros, transeuntes e ate a policia, temos ai uma expressao bastante clara daquilo que no Brasil e o nosso ethos imperial/hierarquico recalcado: A elite tudo pode: por ser elite, esta acima do bem e do mal; apesar de todo o decoro que demonstra nos rituais publicos, perde-o rapidamente em seus rituais privados. A mesma elite "cansada" de corrupcao e falta de etica exibe tranquilamente, dentro de seus apartamentos e festas exclusivas, toda a falta de etica que critica em publico. Esta cansada de traficante mandando no morro, mas nao hesita em demonstrar o dominio sobre o seu proprio feudo, Copacabana e adjacencias. Esta cansada de corrupcao, mas joga ovos na policia, demonstrando ao mesmo tempo o desrespeito pela lei e ordem e o total desprezo pelas instituicoes que a protegem. Esta cansada da falta etica, mas e incapaz de esconder o preconceito com as simbolicas "vagabundas" (Geni!) e outros grupos sociais desfavorecidos, que por serem despreziveis podem e devem ser alvos de brincadeiras esdruxulas e humilhantes. Protegida pela condicao de ser elite, certa parcela dessa populacao se sente no direito de ter tudo e de nao dever nada a ninguem. Depois nao entende o porque de deputados, exibindo a mesma falta de etica e decoro, sao incapazes de fingir que trabalham, nem diante de cameras de televisao. O video dos ovos no Rio me faz lembrar Marie Antoinette, brincando de ser camponesa em meio a pobreza e desespero. Incapaz de perceber seu momento historico, legou aos anais da historia a sua frase "que comam brioches". Na sua inocencia, tornou publico o lugar nefasto que a elite francesa da epoca ocupava. Nos dias de hoje, tais frases rapidamente espalham-se pela internet, a meu ver com o mesmo efeito. Mas no caso do Brasil, nao sei se chegaremos algum dia a fazer algo a respeito, alem de execrar essa parte podre da elite em textos de blogs e jornais.






A crescente perplexidade da populacao com essa falta de decoro, que elege o Parlamento (sic) como instituicao-simbolo do desprezo pelos reais problemas da sociedade, do elitismo e da malandragem, de novo demonstra a dificuldade da cultura brasileira de digerir a democracia. Nostalgicos do Imperio e do governo militar, muita gente ainda associa a ideia de democracia a baderna, e a figura do deputado com incompetencia. E parece que a nossa "elite" (sic) faz de tudo para provar essas pessoas que elas estao corretas. Minha decepcao com a esquerda e a de que, cumprindo uma certa necessidade historica, provaram ser capazes de mobilizar a populacao em torno de um candidato que seria, a principio, um "outsider" nessa ordem. Lula, mais do que um candidato "do povo" ou "proletario", seria o simbolo-indicio de que a democracia poderia criar raizes, de que a alternancia do poder poderia funcionar ordenadamente, e de que outras elites poderiam levar a cabo mudancas, contra o proprio sistema, a favor da populacao. A crescente adaptacao da esquerda no poder ao esquema vigente demonstra a incapacidade dessa esquerda de perceber essa janela historica. Indica a eterna solucao brasileira para evitar a mitologica revolucao: o sistema sobrevive apesar de tudo, dentro ou fora da democracia, e as desigualdades sao protegidas acima de qualquer outro principio. A permanencia da desigualdade no Brasil e um caso tao importante quanto pouco estudado e compreendido na historia social e politica do planeta.

Ao deixar-se levar pelas maracutaias do sistema, ao adaptar-se em demasia, a esquerda atual comprova os velhos preconceitos de que pobre, quando come mel, se lambuza. Deriva-se dai a ideia de que o "povo" (outro mito permanente) deveria mesmo permanecer no seu lugar, ao inves de tentar governar a si proprio. Lembro-se daquele grande "heroi" (SIC) da etica na politica, o Sr. Roberto Jefferson, chamando os petistas de "ratos magros". Poucas vezes o circo de horrores que e a elite politico-economica do pais ficou mais evidente do que durante os primeiros momentos do escandalo do Mensalao. Que nada aconteceu a ninguem, a nao ser uma cassassao simbolica de alguns personagens chaves, demonstra a infinita capacidade do sistema politico brasileiro em reproduzir-se e manter a sua coerencia, mesmo na pior das adversidades. Demonstra tambem a "cordialidade" da populacao, que nao tomou as ruas.

Sinto de longe uma certa radicalizacao da politica no Brasil, especialmente desde o desastre da TAM. Pessoas com um minimo de interesse na historia do pais comecam a sentir um certo cheiro de "golpismo", expresso em campanhas como a do "cansei". Ainda que seja diferente da Marcha pela Familia, Tradicao e Propriedade, a ideia da elite cansada da "baderna" e que resolve tomar o poder para "arrumar a casa" e recorrente na nossa historia politica. O que me irrita e a incapacidade da esquerda de pensar sobre isso e buscar meios de se projetar para a populacao como diferentes da elite tradicional. Nao sei se isso se deve aos nossos preconceitos inatos contra a esquerda, ou se e incompetencia do governo mesmo. Mas a partidarizacao do debate sobre o desastre da TAM, para mim, demonstra um pessimo sinal. Explicita que a briga desesperada pelo poder sobrepoe-se a criterios minimos de boa governanca, etica, decoro e competencia. Se a atmosfera e de vale-tudo, nao penso que sairemos dessa por um caminho positivo. Fica aqui a minha indignacao e, para ser direto, medo mesmo.

16 de jul. de 2007

A America doente



Neste sabado passado fui ver Sicko, o filme-performance de Michael Moore. Digo performance por que me parece que Moore, nesse filme, mais brincou com signos da recente cultura americana do que com informacao sobre o sistema de saude propriamente dita. Ainda que o filme seja bastante informativo, citando estatisticas sobre a falencia do sistema privado de saude do pais, penso que Moore e mais valioso como provocador do que qualquer outra coisa. Talvez isso seja algo bastante obvio em sua obra anterior, como seu documentario sobre Flint, sua cidade natal no estado de Michigan, e os efeitos perversos da dependencia da industria automobilistica. Mas isso nao tinha ficado claro para mim ate que vi Fahrenheit 9/11. O filme Sicko abusa de referencias simbolicamente "perigosas" aos americanos, como musicais operarios da antiga Uniao Sovietica, como forma de criticar o medo que a cultura americana ainda tem do que se chama por aqui de medicina socializada. O termo, que em ingles necessariamente evoca o planejamento centralizador do comunismo europeu oriental, descreve simplesmente um sistema estatal de saude publica, algo que no Brasil nao seria visto como outra coisa do que a minima obrigacao do governo. Em termos de performance e simbolismo, o mais interessante a meu ver e como ele cita constantemente o clima de fundamentalismo autoritario de Bush e seu discurso pro-guerra, ao brincar constantemente com os simbolos do neo-patriotismo conservador. Ao levar voluntarios que ajudaram a salvar vitimas do 11 de Setembro em Nova York (o maximo do heroismo), e que ali contrairam graves doencas respiratorias, para serem tratados em Cuba (onde vive o demonio encarnado em Fidel, segundo o proprio filme ironiza), Moore cutuca com tudo o que pode o conflito ideologico que parece apenas escalar no pais. Distantes do medo coletivo causado pelos ataques as torres gemeas, os americanos parecem cada vez menos convencidos de que uma guerra no Iraque e algo justo, ou que as politicas de Bush fazem algum sentido. A popularidade do atual presidente e baixissima, e ate republicanos ilustres cansaram-se da sua politica externa. No cinema em que eu estava, por exemplo, o publico bateu palmas ao fim de Sicko, e tambem no meio do filme quando um ex-membro do Parlamento Britanico disse, ao explicar o valor de um sistema publico de saude: se existe dinheiro para matar pessoas em guerra, ha que se haver dinheiro para salvar vidas tambem. Ainda que a amostra do publico, por ter ido ao filme de Moore (simbolo do que aqui se considera uma esquerda radical), seja pouco representativa da populacao americana media, nao se pode negar que ha uma clara radicalizacao de ambos os lados: conservadores e liberais. O radicalismo de Bush, que constantemente testa os limites da lei a fim de manter suas politicas, utilizando-se de um patriotismo basico ao espirito americano, esta conseguindo levar os liberais, ou a esquerda, a se reconfigurar para competir com um discurso que tenta ao mesmo tempo ser americano e cosmopolita. Nao se pode subestimar os valores americanos de guerra, mas a nocao de que a liberdade de imprensa e o pleno funcionamento da republica ainda conseguem mobilizar a grande parte da populacao.

14 de jul. de 2007

6 de jul. de 2007

Gotta love the 1990s

Ja devo ter postado isso antes, mas hoje deu saudade de novo dos anos 1990... Todo mundo AMA, ADORA os anos 1980... Eu sei que pela minha idade eu deveria ter curtido, mas na verdade comecei a sair e a dancar depois de 1995, eu ja tava mais velhinho, entao as musicas que eu gosto sao dessa epoca... Tipo essas que eu tava ouvindo agora:

Armand Van Helden (gosto de tudo dele basicamente)



The Bomb! (eu pirava com essa musica... ah bons tempos que ir numa "boite" ou "clube" era emocionante!)



Cassius 1999 (sem comentarios, acho a musica e o clipe perfeitos)



E por ai vai...

2 de jul. de 2007

Saindo do Texas?

Enquanto aguardo pra saber se fico por aqui mais um tempo ou nao, montei um filmete com umas imagens que eu tinha sobrando aqui de Houston. Fiz no iMovie em 10 minutos, entao ta ruim mesmo, e so pra mostrar os predios da cidade e tals. Nem ta editado, montei na ordem que estavam na fita. E mais uma expressao da minha ansiedade e impaciencia do que qualquer outra coisa...

23 de jun. de 2007

20 de jun. de 2007

"Juneteenth" no Texas


O Texas e um estado engracado... A abolicao da escravatura nos EUA aconteceu na segunda metade do seculo 19, mas os escravos do Texas nao ficaram sabendo ate 2 anos depois! Atualmente moro numa zona limitrofe da cidade, entre as casas descoladas de professores e alunos da Universidade, e a Zona Leste, antiga zona dos negros na epoca da segregacao legal, e atual regiao de maioria negra, bastante violenta e com alta incidencia de pobreza, trafico de drogas, entre outras amenidades. Ainda que Austin seja um enorme suburbio, calma e descontraida (chinelos havaianas sao, a 16 dolares o par, de uso quase oficial entre alunos da universidade, por exemplo), ha toda uma historia violenta mal contada. Como a midia passa o tempo todo se debatendo sobre o tempo que fara durante a semana, analisando desde a direcao do vento ate a quantidade de particulas de polen do ar, sobra pouco tempo para noticias de verdade... Abaixo, a definicao da Wikipedia do recente feriado do Juneteenth:


Juneteenth, also known as Freedom Day or Emancipation Day, is an annual holiday in fourteen states of the United States. Celebrated on June 19, it commemorates the announcement of the abolition of slavery in Texas.


History
Though the Emancipation Proclamation had been issued on September 22, 1862, with an effective date of January 1, 1863, it had little immediate effect on most slaves’ day-to-day lives, particularly in Texas, which was almost entirely under Confederate control. Juneteenth commemorates June 19, 1865, the day Union General Gordon Granger and 2,000 federal troops arrived on Galveston Island to take possession of the state and enforce the emancipation of its slaves. Standing on the balcony of Galveston’s Ashton Villa, Granger read the contents of “General Order No. 3”:

The people of Texas are informed that, in accordance with a proclamation from the Executive of the United States, all slaves are free. This involves an absolute equality of personal rights and rights of property between former masters and slaves, and the connection heretofore existing between them becomes that between employer and hired labor. The freedmen are advised to remain quietly at their present homes and work for wages. They are informed that they will not be allowed to collect at military posts and that they will not be supported in idleness either there or elsewhere.

That day has since become known as Juneteenth, a name derived from a portmanteau of the words June and nineteenth.

Former slaves in Galveston rejoiced in the streets with jubilant celebrations. Juneteenth celebrations began in Texas the following year. Across many parts of Texas, freed people pooled their funds to purchase land specifically for their communities’ increasingly large Juneteenth gatherings—including Houston’s Emancipation Park, Mexia’s Booker T. Washington Park, and Emancipation Park in Austin. A wide range of festivities are traditionally done to entertain participants, from music and dancing to contests of physical strength and intellect. Baseball and other popular American games are played.

Recent Years
In recent years the holiday has attracted controversy due to outbreaks of violence. During Juneteenth festivities in 2007 crowds attacked cars in downtown Milwaukee. One driver was pulled from his vehicle and severely beaten before police arrived. A woman was also arrested during the festivities for assaulting a police officer.
Also in 2007, in Austin, Texas, a crowd beat a man to death after he attempted to defend the driver of a car which had just hit a child.
(essa ultima aconteceu ontem e ja esta na Wikipedia!)

18 de jun. de 2007

Happy Tree Friends

Pra quem curtia isso, agora estao no Youtube... Eu sempre achei meio fracos, essa mistura de estetica infantil com sangue, mas na verdade sempre gostei. E que da nojo mesmo...

12 de jun. de 2007

Liquid Sky (1982)




Ja que o post abaixo fez relembrar essa coisa anos 1980, que eu alias nunca gostei e desejaria que nunca tivesse voltado, vamos aprofundar a tendencia e falar de um dos filmes legais que vi no fim de semana, entediado. Liquid Sky, uma ficcao cientifica bizarra repleta de modelos drogados, sexo facil, androginia e crises existenciais, com poemas mal escritos no meio. Falando assim da a entender que detestei o filme, o que nao e o caso. Tudo bem que algumas das premissas do filme, ainda que pudessem ser interessantes, soam cafonas. Como o embate entre a modelo cocainomana e emocionalmente fragil, usada pela namorada lesbica e abusada por todo homem que aparece no seu caminho, e um de seus professores ex-hippies. Tipo, voces com seus jeans acharam que estavam lutando pela liberdade; nos anos 80, pelo menos a gente sabe que nao e livre. Briguinha de subcultura, qual droga e mais legal, qual sexo livre e mais ou menos livre... No final, os anos 80 ganharam disparado. Hoje em dia nao existe alternativa mesmo, tudo que e "alternativo" e tomado pela ideia de que transar com todo mundo e se drogar sao revolucionarios, e que a roupa que se usa define sua ideologia. Vendo o filme, me senti na Sao Paulo de 2002, quando cheguei la, deslumbrado pela "liberdade" que a decadente metropole me oferecia, sedento para fazer parte de rodinhas de "modernos" e pessoas interessantes em geral. Depois de um tempo, tudo o que eu queria era que meu amigo parasse de tomar extasy todo fim de semana e que eu pudesse conversar com alguem "normal", que entendesse minha necessidade de tomar cafe da tarde todo dia... Mas enfim, de volta ao filme: a moda e elemento marcante da historia, e chega a ser um personagem a parte. Coisas bem bizarras, tipo aquelas aberturas do fantastico horrendas do Hans Donner. Uma das cenas mais legais e um show que a performer/poeta/lesbica/traficante/boemia faz numa boite de NY (ja viu esse filme antes ne? Pois e), com batidas eletronicas que me fizeram lembrar de tantas noites n'A Loca. Ao final, talvez os anos 80 voltaram por que nunca superamos a decadencia que eles abracaram. Cocaina, moda, desilusao com a perda das ilusoes, capitalismo desenfreado... Nao vou aqui fazer discurso pseudo-sociologico em cima de cultura pop urbana (afinal o filme faz isso de forma muito mais interessante). Vale a pena para uma noite vazia, para o nerd que existe dentro de voce conhecer um pouco mais sobre esse periodo fascinate do fin de siecle que passou.

1 de jun. de 2007

Hoje acordei desse jeito

... sentindo que cai de novo na mesma besteira de sempre... Insonia, irritacao, pesadelos. Por mais que a gente se defenda, por dentro, algo em mim sempre sente que se deu mal. Algo em mim sempre me empurra pra isso, e depois eu fico naquela onda de fazer o luto, de tentar esquecer, de nao querer fazer isso nunca mais, de tentar achar outra coisa. Pelo menos nesses dias eu escuto uma musica como essa, e entendo de uma forma que nunca entendi antes. Acho que talvez seja a voz da Lily Allen que me fez (re)descobrir essa musica, que nunca constou nos meus top 20 da infancia.



Pra cantar junto:

Once I had a love and it was a gas
Soon turned out had a heart of glass
Seemed like the real thing, only to find much o' mistrust
Love's gone behind
Once I had a love and it was divine
Soon found out I was losing my mind
It seemed like the real thing but I was so blind
Much o' mistrust
Love's gone behind
In between what I find is pleasing and I'm feeling fine
Love is so confusing, there's no peace of mind
If I fear I'm losing you
It's just no good, you teasing like you do
Once I had a love and it was a gas Soon turned out had a heart of glass
Seemed like the real thing, only to find much o' mistrust
Love's gone behind
Lost inside
Adorable illusion and I cannot hide
I'm the one you're using please don't push me aside
We coulda made it cruising yeah
La, La, La, La, La, La, La, La, La, La La
La, La, La, La, La, La, La, La, La, La La
Yeah, riding high on love's true bluish light
Ooh, oh
Ooh, oh
Ooh, oh
Ooh, oh
Once I had a love and it was a gas
Soon turned out to be a pain in the ass
Seemed like the real thing only to find much o' mistrust
Love's gone behind
Ooh, oh
Ooh, oh
Ooh, oh
Ooh, oh

28 de mai. de 2007

Degas e a representacao

Estava passeando pela Rua Guadalupe, perto do campus aqui em Austin, e entrei numa livraria, atraido pelas ofertas de livros baratos. Livros a 1 dollar, ou 2 ou 3. Como bom viciado, nao pude resistir. Sabia que, uma vez ali dentro, acabaria comprando uma ou outra coisa. Logo achei algo que poderia me interessar: um livro sobre filosofia medieval aristotelica, pre-cartesiana. Esoterico, pensei comigo mesmo, mas vai saber se um dia nao preciso disso, ou nao tenho algum tempo sobrando? provavelmente nunca vou ler, como tantos livros que compro; mas como tantos outros, acabam sendo cruciais em algum momento por algum motivo obscuro. Um outro livro me chamou a atencao: um dicionario de arte francesa do seculo XIX, uma edicao linda, com papel de alta qualidade e imagens a cores. Folheando o livro achei bastante esoterico tambem, mas nao resisti, comprei. Fui tomar um cafe logo depois e abrindo os livros, de de cara com a seguinte imagem:

O quadro chama-se L'etoile, e foi pintado por Degas entre 1876-1877. Fiquei fascinado pois, como num post abaixo onde falo da queda de Icaro (ou nao falo, pois ai esta o "point" da coisa), aqui o quadro me pareceu fascinante pela forma como trata da questao da representacao. Sim, alguns leitores diriam que estou projetando minhas obsessoes em cima da obra, mas ainda que seja isso, seria uma leitura valida. Degas, ainda que nao seja impressionista por definicao, circulou no movimento e e lido como um deles. Uma das coisas que me fascinam no Impressionismo e que colocam em questao a representacao em si mesma. Nesse quadro, parece-me que aqui a questao aparece duplamente: tanto na forma de pintar quando no tema pintado. Deixo ao leitor a tarefa de imaginar uma leitura do quadro nesses termos, afinao o post era mais para marcar o momento, e enfeitar meu blog com essa linda imagem...

26 de mai. de 2007

Bandy Bandy

So uma musiquinha que eu achei e gostei... Lembrei-me do quanto gosto da Sra. Badu, e do quanto escutei algumas musicas dela.

23 de mai. de 2007

Zwartboek (Paul Verhoeven, 145 min, 2006)


So para nao perder o costume, ja que andei indo ao cinema ultimamente, posto aqui um pequeno comentario irrelevante sobre esse grande filme do diretor holandes Paul Verhoeven. O filme me faz lembrar Sampa (ultimamente tudo me faz lembrar aqueles 4 anos), e do filme que vi numa sessao Comodoro qualquer: De Vierde Man, ou O Quarto Homem, de 1983, se nao me engano. Uma historia bizarra sobre assassinato, homosexualidade e paixoes proibidas. Conhecia Verhoeven basicamente por Tropas Estrelares, um filme de ficcao cientifica que poderia passar completamente desapercebido como mais uma tentativa de copiar Guerra nas Estrelas, nao fosse o subtexto eugenico e nazista, entre outras criticas sociais interessantes que aparecem no filme. Apos ver O Quarto Homem, abriu-se uma nova percepcao desse cineasta, e senti que havia ali algo que eu deveria descobrir mais a fundo. Quando o filme abriu aqui, depois de sofrer para conseguir uma carona ao cinema (bons tempos em que eu andava a pe para todos os meohores filmes do mundo! No Texas quem nao tem carro nao faz nada) pude me deliciar com uma narrativa insolita, ainda que supostamente baseada em fatos reais, de uma garota judia, escondida do governo nazista que ocupara a Holanda, e que infiltra-se nos mais altos escaloes do nazismo local.
Para mim o interesse maior foi investigar essa ideia de Verhoeven como um cineasta do insolito e do bizarro, um pouco como Lynch (este que conseguiu firmar-se como detentor dessa marca), mas de uma forma altamente sexualizada, levando em conta as paixoes humanas e explorando vertentes dessas motivacoes que nao sao exploradas em outros roteiros, por outros cineastas. Como comentario sobre o filme sei que nao acrescentei nada a compreensao de ninguem sobre o filme ou sobre o cineasta, mas posso dizer que as 2 horas e meia de filme conseguem deixar a impressao, salvo alguns exageros, do quanto a realidade consegue ser mais insolita que qualquer ficcao poderia pretender ser.

9 de mai. de 2007

O filho de Komentarista

Faz um tempo que nao escrevo nada no blog. Nao por falta de material escrito, mas por que ultimamente tenho canalizado muita energia criativa no meu atual trabalho. Ando produzindo muitos textos que estao presos num limbo, sem serem lidos por ninguem, nem serem aproveitados para outras coisas. Por conta disso, resolvi criar um outro blog, companheiro do Komentarista, para publicar o material que ando produzindo ultimamente. O blog se chama Anthropologies of the Body, e esta em ingles por conta do meu contexto profissional aqui em Austin. Sao textos mais teoricos, mas com muitas das coisas que tenho feito no Komentarista. Sao textos de aulas, coisas que pensei e escrevi, e pedacos das minhas pesquisas atuais. Infelizmente o Komentarista, blog que eu amo, vai ficar mesmo de lado por um tempo, mas convido a todos conhecerem meu novo blog e continuarem a ler e a comentar minhas ideias.

8 de abr. de 2007

Grindhouse (Rodriguez/Tarantino, 2007)



O comeco do filme me fez lembrar uma sessao dupla, talvez a unica verdadeira que eu tenha visto (a parte o Comodoro), em Belo Horizonte, em algum ano no inicio desse seculo. Sessao dupla, um cinema podre pertinho da rodoviaria da cidade; primeiro um filme de kung fu, e depois um porno. Sessao quase vazia, local perigoso, cinema sujo, mas a experiencia antropologica era tao unica que nao consegui resistir e assisti ao kung fu e parte do porno (tenho uma tara por porno cinematografico dos anos 1970, mas sobre isso quica escreverei num outro dia). Filme antigo, mofado e riscado, barulheira da maquina de projecao, quedas na projecao constante, cortes absurdos (nao se sabe se do filme ou se dos donos do cinema, que recriaram a obra na pratica de manter em exibicao filmes de 30, 40 anos atras, sem nenhuma conservacao). Talvez por ter tido essa, entre outras, experiencias com filmes dos anos 70, enriquecida pelo acervo comodoriano, e por leituras e curiosidade pessoal, tive uma sensacao de extrema familiaridade com a estetica proposta pelo Grindhouse. Como se algo ali estivesse falando a minha sensibilidade tambem. Nao me interessei tanto pelos comentarios meta-linguisticos possivelmente presentes em Tarantino (uma critica a filmes Hollywoodianos massificados, ou uma recuperacao de artes perdidas por causa da revolucao digital), ou pelas piadinhas um tanto sem graca do filme de Rodriguez. Fiquei sim extasiado ao ver um sofisticado filme de terror, dividido em duas partes, cada uma com um valor proprio. Senti-me inebriado de lembrancas e antigos prazeres, renovados pela releitura dos diretores. Embora o filme de Rodriguez seja absurdamente delicioso de assistir, por causa da diversidade de tipos bizarros a la John Waters, entre outros, citando um sem numero de filmes de terror ruins e bons, o de Tarantino, a meu ver, chega a ser 10 vezes melhor. Penso que com esse filme, Tarantino atinge um novo patamar na sua arte, quando consegue se aproximar de obras acabadas como Caes Raivosos de Mario Bava (calma puristas, eu sei que nao tenho como comparar ambos, mas aos iniciantes como eu faz algum sentido). Eu sempre o achei interessante, novidadeiro, mas somente "bom". Dessa vez, o achei excelente. O filme trabalha bastante com o ritmo. Lento, detalhista, microscopico, intercalado de uma intensidade unica num filme americano. Talvez uma leitura somente de Bava, mas com certeza com temas proprios de Tarantino. Ah, o desejo de vinganca! A delicia da perseguicao! A adrenalina correndo pelas veias, ainda que eu estivesse ali sentado, ha mais de 3 horas! Palmas ao final do filme. Detalhes interessantes sao de que o filme de Tarantino se passa aqui, na cidade de Austin, e presta homenagem a instituicoes da cidade como os cinemas Alamo (os quais ja mencionei aqui), entre outros exemplos da iconografia da cidade. Ao que parece, Austin se tornou um nucleo de producao de filmes importante, exatamente por conta de cineastas locais como Rodriguez (nunca vi nenhum deles permbulando por ai, caso alguem pense isso. Fico trancado em meu escritorio ou em casa, lendo e escrevendo, como bom nerd que sou). A mistura unica de modernidade, saudosismo hippie, fundamentalismo cristao e orgulho texano faz da cidade realmente um polo de coisas bizarras e interessantes digno de nota.
PS: Depois de uma experiencia bastante pessoal com o filme, mais fichas caindo na minha cabeca, relacionadas a eventos na minha vida amorosa, que resuscitou das cinzas. Chegada a inevitavel fase adulta, velhos dilemas me parecem infantis, e coisas que me exasperariam no passado me soam repetitivas e menores. Meus objetivos se ampliaram, tornaram-se mais ambiciosos, na mesma medida em que minha paciencia diminui. Estar com alguem bem mais jovem, ainda que emocionante, me fez repensar a minha propria condicao de adulto. Nesse sentido, talvez fosse algo que eu precisasse experimentar nessa fase da minha vida. Enfrentar novamente alguns medos me fazem lembrar o quao dificil e resolver dilemas pessoais, mesmo depois de 2 anos de reflexao. E talvez o celibato nao seja mesmo a resposta para nada. Ha que se aceitar, talvez, a incerteza da vida, em troca de insegurancas e possiveis perdas. Talvez a maior perda seja nao estar no jogo, ainda que na minha cabeca de adolescente, relacionamentos so podem ser bons quando nao sao jogos (alguem conhece algum que nao seja jogo? Mostre-me, pois so acredito vendo!). Ate onde o jogo e humano, e nao cruel? Ate onde ser discreto e diferente de mentir? Qual e o limite e a diferenca entre "dar corda" e "ir com cuidado"? Questoes que ficam sem respostas.

19 de mar. de 2007

Filmes do Finde


O blog ta totalmente largado e desanimado... Mas e falta de tempo e inspiracao. Alem disso, a vida real anda consumindo tempo demais, tanto em termos de trabalho como de diversao. Sobre o fim da minha seca de uns 2 anos, prefiro nao comentar: sao tantos os sentimentos que passam pela minha cabeca que mal tenho palavras. Nao se apresse, caro leitor: nao e questao de amar alguem, e uma questao de cair fichas sobre voce mesmo, com a ajuda de uma pessoa que por acaso esta catalisando essa reacao em mim. O engracado e como a coisa toda tem tudo para ser precaria, tem tudo para dar errado, e mesmo assim permanece... Nunca vivi nada parecido, e isso e algo maravilhoso.

Sobre 300: um filme bonito de se ver, mas sinceramente, nao consigo perceber de onde veio tanto hype. Sim, os homens sao malhados e bonitos. Sim, a tecnica visual e inovadora e interessante. Sim, a adaptacao de uma "graphic novel" e como que uma tendencia interessante, ainda que me pareca tao metalinguistico que perca muito da sua forca. Acho que faltou algo ao filme, ou a historia, mesmo com a riqueza de personagens fascinantes e complexos. A complexidade fica mais sugerida no aspecto visual do que explorada pelo filme. Talvez na traducao dos HQ para a telona, algo se perca... Que os experts em graphic novels, e os fas, comentem isso melhor do que eu! Eu to mais preocupado em ver Grindhouse, que abre aqui em muito breve (ja que perdi TODOS os filmes do festival South by Southwest). Sim, Santoro da um show de interpretacao, como de costume; alias, a cenas com os persas sao das coisas mais interessantes do filme, exatamente pela falta de realismo que o "outro" exotico permite.

Das Leben Der Anderen (Alemanha, 2006, Florian Henckel von Donnersmarck) (http://imdb.com/title/tt0405094/), que ganhou o Oscar de melhor filme estrageiro, e marcante, sutil, complexo e maravilhoso. Pode ser que eu esteja predisposto hoje a esse tipo de filme, mas fiquei tocado. Sao filmes assim, que me fazem beirar as lagrimas, que fazem aquela grana toda que a gente paga na entrada valer a pena!
PS: O festival South by Southwest tranforma Austin na capital cultural do pais por alguns dias. Muita gente do mundo todo, muuuitas bandas, muuuitos filmes. Algo que era Indie hoje e parte do circuito da industria. Nao vi quase nada, mas consegui na sexta feira passear pelos bares da cidade e curtir pedacos de shows menos famosos, que estavam gratuitos, experiencia unica. Perdi o Bonde do Role, de funk curitibano. Incrivel como essas bandinhas sao conhecidas da criancada daqui!

9 de mar. de 2007

O Brasil tem jeito

Depois de ver o curta abaixo, to achando que e um classico instantaneo... Cortesia de Josias de Souza e seu blog. Mais uma prova de que Recife e uma potencia criativa. Ate perdoo o policial carioca xingando o gringo de "alma sebosa"!

8 de mar. de 2007

Reach Out, 1975

Enquanto eu tava nascendo, o povo estava "shakin' it"... Sem assunto, navegando no Youtube, ja viu entao ne!

27 de fev. de 2007

Retornando

Retirar-se do fluxo normal da vida por quase dois anos tem la as suas vantagens. Serve como uma maneira de quebrar vicios forcosamente. Uma quebra brusca da rotina te impede de repetir padroes de comportamento, de procurar conforto em antigos vicios (substancias, pessoas, etc), de continuar sendo algo com o que voce nao esta satisfeito. Ha que se esclarecer que fica muito mais facil entender as coisas quando temos o privilegio de olhar para tras. Enquanto estamos passando por algo assim, tudo parece turvo, confuso e sem sentido nenhum. O problema e voltar. Como voltar? O que retomar, e o que ficou definitivamente para tras? Se experimentar nao e tao atraente como era antes, como fazer agora? Como se comportar diante da infinidade de coisas que o mundo oferece, sem repetir a mesma vida que voce tentou a tanto custo largar para tras? Isso sem falar nos questionamentos mais impulsivos e negativos, do tipo: precisava tanto tempo? Nao foi tudo uma crise idiota sem nenhum motivo valido? Mas esse tipo de pensamento nao tem muita valia depois que a coisa ja aconteceu. Dado o fato da quebra, da interrupcao, e da recente necessidade de voltar a ser alguem que sai, namora, socializa, tem projetos de futuro e vontades, alguem que nao e crianca mas ainda nao e tao velho assim, como retomar? Sim, tem coisas que a gente nao esquece, mas tem coisas que perdem o sentido, e tem coisas que voce simplesmente nao quer mais fazer. Parece que a cada tantos anos poderei fazer um post assim: a cada nova fase da vida a gente parece que tem que reaprender tudo, recalibrar os reflexos, reorganizar a nossa identidade. Criancas, adolescentes, adultos, mais adultos, etc etc. Aluno, professor, solteiro, amante, casado, familia, conservador, medroso, valente, intrepido. Com cada mudanca me sinto vivendo uma outra vida completamente diferente. Ainda nao entendo o fascinio que algumas pessoas mais jovens tem por mim, mas ainda assim fico lisongeado. Nao sei o que fazer com isso, quando era sempre eu o "mais jovem". Eu tento racionalizar dizendo que estar assim "em aberto" e uma coisa boa, permitindo-me experimentar coisas que eu nao faria antes, por me achar esta ou aquela pessoa; sem os limites de algumas certezas, poderia buscar ser outras coisas, e talvez ser mais feliz. Bom, e o que me resta, sendo que continuo ao sabor do CAOS e de um fluxo as vezes rapido demais para que eu consiga curtir as paisagens que passam por mim enquanto tento ficar com a cabeca acima d'agua, levado por uma correnteza que eu nao faco a minima ideia de onde acaba. A solidao bate cada vez mais forte; so nao sei como me comunicar direito, uma certa volta a adolescencia me tornou de novo receoso e introspectivo, de uma forma nova.
Mas a gente vai levando... Enquanto isso, o blog nao morre, mas as atualizacoes ficam mais espacadas. Agradeco a todos que continuam passando por aqui, e peco desculpas aos amigos que nao leio ha muito tempo. Questoes de momento, como todo mundo ja experimentou.

31 de jan. de 2007

Pois e ne Kassab...

Mandou muito bem! Deveras respeitoso do chefe da cidade fazer piadinhas sobre um buraco que matou 7 pessoas, expondo a incompetencia de administradores como o Sr.! E isso ai, pelo menos o Sr. fez a piada para as cameras, e gracas ao Youtube todo mundo esta vendo!

Charge a distancia


29 de jan. de 2007

Verdades?


As vezes sinto que estou quase la, entendendo o que acontece, o que aconteceu, achando que vou recuperar o caminho que perdi, ou perder a ilusao de que existe um caminho e comecar a viver de fato... Mas me parece que quanto mais chego perto, mais a verdade me parece inescrutavel, complicada...
[imagem: A Queda de Icaro, Bruegel, 1558]

Jazz!

Hoje eu so queria postar essa musica, que achei por acaso no Youtube. Eu sempre me coloco para as pessoas como alguem que nao curte musica nem poesia. Alguem que prefere o silencio ao barulho, a solidao a companhia dos outros. Nada mais longe da verdade. Na verdade e mais facil defender-se dos outros atacando. No processo, perdem-se oportunidades e pontos de conexao, perdem-se pontes e muros se fortificam, ainda que totalmente imaginarios. Mas voltando ao Jazz: eu diria que, na minha concepcao de civilizacao, o Jazz figura como musica classica, por conta da sua origem e da sua sonoridade, de tudo que evoca em termos sociais e historicos, e das possibilidades que abre ao aleatorio ordenado. Numa civilizacao americana, da qual o Brasil ainda resiste em fazer parte, preso que esta ao escravismo e ao imperio, o Jazz figura como estetica e como etica, um tipo de beleza que aceita desconstrucoes sucessivas, somente para se fortalecer nesse mesmo processo. Aceitar o caos como parte integrante do ser. Claro, digo isso sem conhecer nada de Jazz, apenas de ouvir falar. Mas se eu fosse pintar um quadro do que seria essa civilizacao, que necessariamente nasce na America (pensada aqui no sentido amplo, e nao restrita ao Norte), eu certamente estaria escutando algum som parecido com esse. Na America por que somos bastardos de um estupro, um povo estuprando o outro, nao temos origem, somos aquilo que foi regurgitado do festim canibal promovido pelos europeus. Pois e, os pobres Tupis mal tiveram tempo de correr pro meio do mato, antes de serem devorados. Mas pelo menos eles, e todos que vieram aqui, deixaram sementes. Sementes que viajam com o vento e atravessam fronteiras, acabam dando frutos os mais bizarros. Talvez um dia eu consiga escrever exatamente o que eu quero dizer, unindo samba, funk e jazz, entre outras coisas, como aquela pintora mexicana, os muralistas daquele pais, e claro os manifestos modernistas brasileiros.
Ou talvez eu esteja apenas divagando ao som do Jazz, escrevendo o que vem a mente enquanto o meu Youtube fica ligado. Ta, talvez eu esteja e com saudades de ir no Sarayevo, beber, sonhar com quebras de fronteiras e com amorosas impossibilidades, e depois de totalmente inebriado tentar me perder de vez no resto de noite que resta na cidade.

26 de jan. de 2007

Primeval (USA, 2007)



Fui assistir a esse filme esperando um filme de terror dos mais apavorantes, por conta do trailer e da publicidade. Quando percebo que estou assistindo a um filme sobre a Africa, genocidio e os horrores do ser humano. Como ja li em outras criticas, a construcao da historia e muito bem feita, mesclando horror com politica e dramas pessoais. Teria tudo para ser um bom filme, mas... nao foi. No final das contas, misturam-se generos de forma mal-acabada e o todo nao convence nem como terror, nem como filme politico. O foco no monstro que aterroriza o vilarejo lembra um filme ao estilo Jurassic Park; logo depois ha a comparacao desse monstro com o monstro em forma humana que comanda com mao de ferro as mafias locais, que nao convence. Ainda que o filme consiga ser ironico, como na cena onde o personagem negro, depois de muito sofrer e escapar da morte varias vezes, diz o quanto a Africa e insuportavel, e que a escravidao foi otima por ter tirado o seu povo de la, a porcao inteligente da historia e subjugada e apagada pela edicao frenetica e pelas cenas de violencia (alias muito bem feitas). Uma oportunidade perdida, mas um roteiro que mereceria ser refilmado com mais cuidado, talvez.

Historia de uma batida

Para que curte historia da musica contemporanea, esse video (que eu achei por acaso no Youtube, como tanta coisa boa que eu curto sozinho ou coloco aqui) explica um pouco como um sample de 6 segundos de uma musica de 1969 deu origem a varias subculturas da musica popular mundial contemporanea. Comecando com o classico hip hop dos anos 1980 (ainda sub-avaliado pela sua importancia) passando pelo jungle e drum'n'bass dos anos 1990 (quem curtia sair nos anos 1990 lembra disso), entre tantas outras coisas, a analise e densa e bastante interessante. Nao resisti postar por causa de um video que postei anteriormente, a respeito do "batidao" do funk carioca, que faz uma analise parecida da historia de um sample, e do seu impacto na musica e na cultura atual. Esse e em ingles, mas vale a pena. Enjoy!

18 de jan. de 2007

A Encarnacao do Demonio (2007?)


Poucas coisas me fazem perder o sono. Geralmente, tenho insonia quando preciso acordar cedo, quando estou no meio de algum projeto importante ou intenso, ou quando estou matutando alguma coisa importante por qualquer motivo. Ontem, navegando pela internet, perdi o sono ao ver o seguinte link: http://imdb.com/title/tt0923683/

O novo filme de Mojica Marins, em producao, ja esta indicado no IMDb. Sera que dessa vez sai entao? Depois de tantas decadas, um filme novo do Mojica? Meus contatos no mundo do cinema me dizem que, contrario aos meus medos de que ele estaria sendo "direcionado", ou "pasteurizado" por artistas menores e com mais acesso a teta estatal e aos mecanismos de captacao e distribuicao, dessa vez Mojica tem a melhor equipe tecnica da sua carreira, e com total liberdade criativa. Como sou mineiro e desconfiado, vou esperar pra ver. So espero que o tal filme espere ate o final de setembro para ser lancado, por que ja estou empolgado!

17 de jan. de 2007

Cartas de Austin

[o texto a seguir, devidamente editado para proteger informacoes sensiveis as partes, e um email que acabei de mandar para um amigo virtual que mora no Brasil. Como gostei do texto, e ele me pos a pensar, resolvi publica-lo aqui. Um dia queria que esse texto fosse lido como um fossil, posto num museu, ao lado de outras coisas velhas e chatas que so fazem sentido para um historiador. O fato desse email continuar fazendo sentido, para mim e para tantos outros, o fato dele ainda tocar em questoes dificeis e sensiveis, diz muito sobre o quao patetico e o lugar reservado a sexualidade na nossa sociedade. Num momento da historia em que o mundo discute casamento e adocao de filhos por casais homossexuais, eu ainda me vejo conversando com inumeros amigos e conhecidos ainda lutando contra fantasmas internos, preconceitos tacanhos e magoas que se arrastam por vidas inteiras. Milhoes, bilhoes de palavras escritas por milhoes de pessoas que ainda tem que lutar contra algo tao extremamente saudavel e natural, um desejo que da sentido a toda a vida, e que mesmo sendo tao extremamente simples e belo continua sendo tao incessantemente perseguido e abafado. Nao somente pela sociedade, mas pelos proprios sujeitos. Nao que meus amigos sejam mediocres ou atrasados: mediocre e atrasada e a sociedade homofobica, que ainda permanece dominante no Brasil e em tantos outros lugares. Eu poderia escrever outras milhoes de palavras sobre isso, mas por hoje basta: que esse post seja apenas mais um daqueles momentos de desabafo, e que se torne velho e desatualizado o mais rapido possivel.]
"
Caro ****
Texano e um bicho estranho... nevou 2 minutos e eles fecharam a cidade inteira! Bizarro e engracado. Ta zero graus hoje, muito gelo na rua, mas na TV parece que ta uma catastrofe... Enfim. Post todo dia muito raro, e com o fim das ferias voltam as moscas ao meu blog. Quanto ao seu irmao, entendo, ja tive isso com os meus, so melhorou depois que eu assumi publicamente que era gay. Nao e piada, e fato, e muita tensao sumiu de uma hora pra outra, por que eles nao tinham mais essa piada pra me jogar na cara, e eu nao tinha mais nada a esconder de ninguem entao nao me incomodava tao facilmente. E chato bater sempre nessa tecla, e eu sei o quao dificil e pra qualquer gay assumir-se publicamente, mas e TAO melhor do outro lado... Claro que cada um tem a sua hora, e nem toda familia aceita, entao esteja preparado para reacoes negativas se contar. Mas como voce ja e crescidinho, acho que nao morre de fome nem se toda sua familia te renegar. Aposto que, pelo contrario, vai emagrecer e ficar mais saudavel depois de tirar esse peso das costas. Sim, estou explicitamente te dando conselhos, mas sei que conselho, se fosse bom, nao era dado, era vendido. Bom fim de ferias!!"

6 de jan. de 2007

Stereo (David Cronenberg, Canada, 1969)



Quando assisti esse filme, encartado junto com o DVD de um outro filme obscuro de Cronenberg (Fast Company, de 1979), entendi um pouco melhor o que tanto me fascina no diretor. Ha varias coisas que poderiam ser ditas sobre o filme, como por exemplo: que ele antecipa grande parte dos temas que o diretor explora mais tarde, especialmente ligados ao corpo, a tecnologia e a sexualidade; o filme serve como exercicio preparatorio para filmes como The Brood, Scanners, Videodrome, The Fly e Existenz, na medida em que mistura uma narrativa cientifica, cruzamentos de fronteiras entre humanos e maquinas e entre identidades sexuais, e sugere temas como telepatia, mutacoes, cirurgias, psicologia, cibernetica, entre outros. O filme e costurado pela narrativa, sempre em off, que sugere um cientista relatando resultados de suas experiencias, ou lendo trechos de livros academicos sobre os temas citados. As imagens, filmadas num predio de arquitetura modernista, com muitas lihas retas e espacos vazios, mostram aparentemente os sujeitos das experiencias sendo relatadas, engajando em todo tipo de interacao, desde olhares, trocas de caricias, ou trocas telepaticas. Destaque para a historia de um especime que fura um buraco na testa no decorrer das experiencias, a fim de se livrar das pressoes que ele relata sentir na cabeca (tema explorado depois em Scanners); a analise das interacoes entre os telepatas, na qual o narrador sugere uma explicacao para a organizacao hierarquica entre os sujeitos (tambem retomada explicitamente em Scanners); e a analise da omnisexualidade como expressao da verdadeira sexualidade humana (tema que aparece de forma velada em varios filmes, desde Crash ate Dead Ringers, entre outros). A semelhanca com filmes de laboratorio confere ao filme um certo tedio asseptico, que foi exatamente o que agucou a minha curiosidade (a origem desse meu fascinio e um minsterio pra mim mesmo). A sucessao de trechos altamente teoricos pesa sobre o filme, e qualquer narrativa fica sugerida somente na sucessao de imagens e numa quase fortuita ligacao entre o texto lido e as imagens. O mais interessante e pensar que Cronenberg antecipa discursos altamente em voga no mundo academico hoje em dia, ao misturar cibernetica com carne, tecnologia e sexualidade. Nao a toa, seus filmes sao constantemente referenciados nos artigos academicos que discutem comunicacao e tecnologia atualmente.

3 de jan. de 2007

1 de jan. de 2007

2006 in a few confessions

  • Assistir a derrota alheia contextualiza de maneira dramatica a minha propria.

  • [Em outros termos, nem sempre conseguimos ter nocao dos nossos problemas, ou ausencia deles, ate que somos pegos no meio dos problemas alheios.]

  • Desde 2005 andava meio perdido. Perseguir objetivos sem saber o porque pode ser uma das causas. Disso decorre, talvez, que a retomada de um rumo depende de uma redescoberta do sentido das buscas, nao importa quais sejam elas.

  • E impossivel viver sem confiar, em alguma medida, nas pessoas. A desconfianca persistente leva a uma busca inutil de controlar todos os aspectos de uma dada situacao, uma tarefa tao inutil quanto impossivel. Alem disso, essa busca de controle total so pode levar a uma paranoia cronica, associada a um estresse constante. Saber em quem confiar e dificil, no entanto: requer pratica, ou tentativa e erro.

  • Ja nao tenho mais idade para algumas coisas. Isso nao quer dizer que a vida acabou; significa que cada etapa tem os seus encantos, defeitos e vantagens. Na teoria e facil. Dificil e refazer as transicoes a cada etapa, quando a sociedade espera que estejamos "prontos" depois dos 18, ou dos 21, ou dos 30.

Brasilia, 2007


Seria comico se nao fosse tragico...

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